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Deputados conseguem piorar a PEC dos Precatórios!

Por Francis Campos Bordas e José Guilherme Carvalho Zagallo, advogados (OAB/RS nº 29.219 e OAB/MA nº 4.059).

Na madrugada de 3 de novembro, a Câmara de Deputados aprovou a Proposta Emenda Constitucional nº 23 com 312 votos, quatro além do mínimo necessário, com votos inesperados de parlamentares de partidos de oposição como PDT e PSB. Alguns deputados de partidos de centro votaram contra a proposta, preocupados com a ultrapassagem do teto de gastos já em 2021 e com a revogação do art. 108 das Disposições Constitucionais Transitórias.

Para conseguir a aprovação dessa proposta, o presidente da Câmara, Deputado Artur Lira, permitiu a votação de parlamentares que estavam no exterior ou em seus Estados, mesmo após a retomada das sessões presenciais naquela casa legislativa.

Além disso, o presidente da Câmara submeteu a votação uma “emenda aglutinativa”, o que, de acordo com o regimento da casa, destina-se a aglutinar em um mesmo texto, diversas emendas ao texto original do projeto apresentadas perante a Comissão Especial designada para análise da PEC.

Lira aglutinou textos que não existiam, já que na Comissão Especial nenhuma emenda foi adiante por falta de quórum mínimo de deputados proponentes.

Por tais motivos, partidos políticos já questionaram essa votação perante o Supremo Tribunal Federal. A OAB elaborou um parecer em que aponta mais de 30 inconstitucionalidades nessa Proposta de Emenda Constitucional, além dessa burla regimental.

Aos que não acompanharam a proposta defendida pelo Governo Federal, resumimos: a PEC nº 23/21 pretende introduzir um limite de gastos para pagamento de decisões judiciais, já a partir de 2022, com valor inferior ao que foi pago nos dois últimos anos, estabelecendo uma fila crescente para a quitação dessas dívidas. A única exceção ocorreria quando o credor concordasse com um desconto de 40% no valor do seu crédito, ou se o vendesse a bancos e corretoras, com deságios ainda maiores.

Além disso, o texto da PEC é tão confuso que deixa aberta a possibilidade de que créditos alimentares percam sua preferência na ordem de pagamento, na medida em que prevê que precatórios não pagos em 2022 ou não expedidos nos próximos anos (por conta do teto), tenham prioridade sobre os precatórios do ano seguinte, mesmo que tenham natureza diferentes (alimentares e não alimentares).

Além disso, resta a dúvida de como seria feito o controle desse limite, na medida em que o ato de expedição de um precatório compete ao Poder Judiciário, ao passo que o controle do orçamento é feito pelo Executivo.

Haverá um alarme do tipo “não-expeçam-mais-precatórios-pois-o-limite- estourou”?

O Judiciário se curvará a essa régua?

Os 312 deputados que votaram a favor da proposta conseguiram piorar o texto que tinha sido aprovado na Comissão Especial que apreciou a proposta e que já trazia inúmeras inconstitucionalidades.

Dois exemplos do agravamento: [1] introduzir a prioridade de pagamento de créditos de precatórios de Estados e Municípios em detrimento a cidadãos e empresas, e [2] ao dar prioridade a titulares de precatórios que sequer tinham sido inscritos na proposta orçamentária de 2022.

A argumentação dos defensores da PEC nº 23 vem lastreada em um falso discurso de que ela é indispensável para viabilizar auxílios sociais por conta da pandemia. Ou seja, para resolver um problema temporário, muda-se a regra permanente de satisfação dos créditos judiciais criando um calote contínuo e gerando uma bola de neve impagável.

O Executivo consegue com isso dispor de uma fatia maior do orçamento para seus projetos políticos em ano eleitoral (aliás, vale para os próximos mandados), em detrimento da efetividade das ordens judiciais e afrontando as bases do Estado Democrático de Direito. A moeda de troca para os parlamentares compactuarem com isso teria sido a promessa de liberação de valores de verbas para destinação por parlamentares, principalmente pelas emendas de relator.

Ainda estão pendentes a apreciação de 11 destaques de bancadas e a votação da PEC nº 23 em segundo turno, o que deve ocorrer a partir desta terça-feira (9).

Espera-se que os deputados responsáveis por esse atentado à Constituição e à Justiça reflitam e revejam seus posicionamentos nessa próxima votação, pois os efeitos de seus votos não estão limitados a este ano ou ao próximo. O prejuízo repercute na própria imagem de nosso país, atraindo o indigesto e constrangedor rótulo de “nação caloteira”.

Fonte: www.espacovital.com.br